Direito à infância
A Associação Ilhas em Movimento organizou no Hotel do Colégio, em Ponta Delgada, uma conferência de imprensa sobre o abuso sexual de crianças. Na ocasião, esteve presente uma vítima deste crime, o qual já tomou proporções absurdas em Portugal e até nos Açores. A ideia realçada na conferência foi o direito que as crianças têm a uma vida saudável física e mentalmente, o que não é de todo possível quando se vivem situações perturbantes destas. Nesse sentido, o presidente da Associação Ilhas em Movimento, Ricardo Pacheco, entende que “deverá existir um direito absoluto a uma infância e juventude felizes”, e por isso a associação deu “início a uma petição visando a criação de uma base de dados com indicação de todos os cidadãos que tenham sido condenados pela prática de crimes de natureza sexual sobre as crianças. A mesma deverá ser fornecida a todas as entidades públicas e privadas, a fim de que esses cidadãos jamais possam desempenhar funções, seja a que título for, em todos e quaisquer locais aonde se encontrem crianças, tais como escolas, creches, jardins-de-infância, hospitais e centros de saúde, áreas desportivas e escalões de formação de clubes desportivos”. É com agrado que afirmamos que a “nossa petição já conta com mais de 500 assinaturas. A AIM pede a todos as pessoas que se identificam com esta nossa luta que assinem a mesma, o que poderão fazer online através do nosso site ou em papel”. Foi visto nesta conferência o outro lado da questão. Habitualmente, o centro destes crimes são os abusadores. A Associação Ilhas em Movimento vai mais longe e por isso afirma que “é fundamental que o debate sobre o abuso sexual de crianças tenha, de hoje em diante, como base a vítima e não o agressor. Quanto ao agressor os tribunais e as demais entidades competentes seguramente tratarão do assunto. É fundamental que, de uma vez por todas, o cerne da discussão resida na vítima. A interrogação que a todos se impõe é: Que fazer por esta criança? E já não: O que fazer com este infractor?” Além disso, um dos aspectos que mais deveria ser lembrado, mas que não o é, reside no acompanhamento psicológico de que estas crianças necessitam após serem maltratadas. “É inaceitável que toda e qualquer criança vítima de abusos sexuais de adultos mal formados viva os anos seguintes à violência de que foi vítima sem um apoio especial e efectivo”. Outras medidas foram defendidas naquela reunião, como o apoio escolar. “É evidente que o rendimento escolar de uma vítima é manifestamente afectado. O Estado não pode continuar indiferente a esta causa”, relembra a associação. A questão da justiça também não nos deixa contentes, uma vez que esse tipo de casos demora, quase sempre, uma eternidade a serem resolvidos, o que só pode dificultar a vivência da criança. Neste seguimento, foi dito por Ricardo Pacheco na conferência que “se as crianças são a nossa prioridade então para quando o aparecimento da figura do provedor da criança? É uma grande injustiça que se tem feito às gerações vindouras manter este assunto no esquecimento. É verdade que muito recentemente o Governo da República decidiu avançar com uma lei que impeça os pedófilos de trabalharem com crianças. A AIM ficou naturalmente satisfeita por ver as suas pretensões nesta matéria começarem a surtir efeito, até porque igualmente a Convenção do Conselho da Europa contra o abuso de crianças o impele. Porém, parece-nos que o propósito governamental pode e deve ir mais além. Por exemplo, é de se louvar a pretensão governamental de prolongar até aos 20 anos a permanência no registo criminal do abusador das condenações por tais ilícitos. Porém, entendemos que é pouco. Na verdade, sendo que tais actos são por vezes praticados por pessoas muitas delas na casa dos vinte anos, obviamente que volvido este tempo, continuam a ser potenciais predadores. Assim, a AIM defende que tal prazo deverá ser superior ou, tais condenações deverão constar sempre no registo criminal do infractor. De igual forma, pese, embora concordarmos até porque igualmente o propusemos, da existência de um mecanismo de controlo no acesso a profissões que impliquem o contacto regular com as crianças e jovens, sob pena de essas entidades empregadoras serem sancionadas, entendemos que teremos de ir mais além, pois, obviamente noutro tipo de colectividades, tais como associações desportivas, sociais e culturais, poderão ocorrer situações deste género. Desta forma, a obrigatoriedade de exigência de certificado criminal a quem seja recrutado para o exercício de quaisquer funções, deverá ser exigido não apenas para às empresas mas igualmente para todas as colectividades e organismos que trabalhem ou se relacionem com crianças”. Outras iniciativas e propostas serão apresentadas em breve pela associação, dentro desta área, “bem assim em tudo aquilo que nos possa levar a que seja claramente consagrado na nossa legislação um verdadeiro estatuto da criança. Na verdade, para quando um Estatuto da Criança e do Adolescente à semelhança do brasileiro? A AIM lança o repto a toda a comunidade lusitana que se envolva na discussão de um projecto desta natureza. Por nós, daremos o nosso contributo. Iremos igualmente organizar uma marcha pacífica pela consagração de um direito à infância absoluto. Vamos procurar interagir com as outras forças vivas da sociedade para que tal desiderato se concretize”. A testemunha presente mostrou-se inteiramente de acordo com esta causa nobre da AIM, afirmando que é uma injustiça uma pessoa passar por uma situação como esta, uma vez que todos temos direito a ter uma vida íntegra e feliz. Dada a sua experiência de vida, realçou que viver desta forma causa uma dor que simplesmente não passa. É um tipo de vida que traz tristeza, isolamento e solidão. Na sua opinião, ninguém deveria passar por isso, apesar de muita gente viver este flagelo. Assegurou ainda que a segurança e o sossego de espírito é algo com que estas crianças nunca conseguem viver, estando constantemente ansiosos e aflitos, quer acordados, quer a dormir. Continuou a crítica dizendo que a sociedade nada faz para minimizar a dor a estas vítimas, quando se vive a paredes meias com esta realidade. Comungando dos princípios da AIM, a testemunha apela a todas as pessoas que se associem a esta causa, com o objectivo de reduzir o número de casos existente, o qual se torna, de dia para dia, mais elevado.
Ponta Delgada, 20 de Março de 2009 Gratos pela vossa atenção A Direcção da AIM.